Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular apresenta no Rio mostra sobre indígenas do Vale do Mucuri (MG), destacando o uso da embaúba em arte e cura. Evento inclui pré-estreia do filme Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá, que estreia nacionalmente dia 10.
Por Redação – do Rio de Janeiro
O Rio de Janeiro recebe um importante panorama documental sobre a etnia indígena Maxakali, do Vale do Mucuri, a única a manter-se falando a própria língua em todo o Estado de Minas Gerais. Dia 3 de julho, às 17h, será inaugurada a exposição Hãmxop tut xop – as mães das nossas coisas: artesanato em fibra de embaúba, na Sala do Artista Popular (SAP) do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (CNFCP-Iphan), no Catete, Rio de Janeiro, com a presença da Ministra dos Povos Indígenas Sônia Guajajara. O público poderá conhecer como os Maxakali mantêm viva a ritualística com a embaúba, árvore natural da Mata Atlântica, hoje quase extinta nos territórios em que eles habitam no Nordeste mineiro. Entrada gratuita. Hãmxop tut xop – as mães das nossas coisas: artesanato em fibra de embaúba enfatiza o protagonismo da embaúba na cultura e nas tradições. A fibra retirada da embaúba é a base para a tecelagem de bolsas, colares e braceletes, únicos e repletos de significados. A embaúba é considerada instrumento de cura. Na abertura, ocorre a pré-estreia do filme Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá, sobre a busca de Sueli Maxakali pelo pai, indígena da etnia Kaiowá retirado da convivência na aldeia durante a ditadura militar. A exibição, seguida de debate, será na área externa do CNFCP.

Responsável pela pesquisa e texto da exposição, o antropólogo Roberto Romero é codiretor do filme. Há 15 anos convive com os Tikmũ’ũn, autodenominação do povo também conhecido como Maxakali. O povo é tema tanto de seu mestrado, como de seu doutorado. “Esta é a primeira vez que ocorre uma exposição da arte das mulheres Tikmũ’ũn, na SAP. É uma oportunidade importante para dar a conhecer a admirável tecelagem da fibra natural da embaúba, um patrimônio cultural deste povo”, diz.
Doutor em Antropologia pelo Museu Nacional (UFRJ), desde 2023 Romero integra a equipe de coordenadores do projeto Hãmhi, Terra Viva, que forma agentes agroflorestais e viveiristas indígenas Tikmũ’ũn. É a partir daí que também passa a atuar nos quatro territórios demarcados no Vale do Mucuri.
Atualmente, uma série de iniciativas impulsionam o resgate da presença Maxakali no Brasil. De acordo com o Censo de 2022, no país existem mais de 300 etnias indígenas. Desse total, 19 etnias habitam o estado de Minas Gerais. A população Maxakali é estimada em 2.629 habitantes.
O povo Tikmũ’ũn está distribuído entre as aldeias Água Boa, Pradinho, Aldeia Verde, Cachoeirinha e Aldeia-Escola-Floresta, nos municípios de Santa Helena de Minas, Bertópolis, Ladainha e Teófilo Otoni – uma das regiões que mais aqueceu no Brasil nos últimos anos, segundo dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).
No texto do catálogo, acessível no site do CNFCP (www.cnfcp.gov.br), Romero oferece um breve inventário dos Maxakali. “Árvore muito comum na Mata Atlântica de cuja casca as mulheres Tikmũ’ũn extraem fibras usadas para fiar as linhas com as quais tecem bolsas, redes, colares, pulseiras, cordões, tipoias e máscaras para os espíritos yãmĩyxop, desde tempos imemoriais. Entre as/os Tikmu’ũn, a busca pela embaúba é uma tarefa compartilhada por um ou mais casais, mas também por mulheres viúvas ou solteiras, geralmente acompanhadas por seus genros ou primos. Aos homens, cabe abrir caminhos na mata e cortar as árvores, muitas vezes de difícil alcance. Às mulheres, cabe descascá-las com a faca e as mãos, enrolá-las delicadamente e transportá-las até suas casas, onde raspam as cascas, extraindo a fibra que usam para fiar manualmente as linhas em suas coxas”, contextualiza.

Para Rafael Barros, diretor do CNFCP-IPHAN, a exposição do artesanato Maxakali soma às iniciativas para o fortalecimento da etnia. “Trata-se da última etnia a falar a própria língua no estado de Minas Gerais! Há um conjunto de ações multidisciplinares para fortalecer os Maxakali, como o programa Terra Viva, que visa garantir as condições do povo com seu bioma tradicional, por exemplo”, destaca o diretor.
A etnomusicóloga Rosângela de Tugny coordena a iniciativa que vem mudando a paisagem nos territórios Tikmũ’ũn, “O projeto Hãmhi, Terra Viva contribui para o enfrentamento das mudanças climáticas e tem como perspectiva o reconhecimento da força linguística e cultural do povo Tikmũ’ũn, apresentando um modelo de formação profissionalizante em nível médio que, a um só tempo, valoriza sua riqueza linguística e fortalece a autonomia alimentar”, afirma Rosângela de Tugny, coordenadora-geral do projeto.

Etnomusicóloga, Rosângela pesquisa o universo Maxakali há 20 anos. “O povo possui 12 sistemas musicais, em termos de comparação, como se fossem 12 latins”, compara. De mitologia fina e complexa, a resistência secular de um repertório simbólico como o Maxakali está contida nos cantos. “Passei oito anos registrando os cantos. Levei um estúdio da Universidade Federal de Minas Gerais para gravar direto com os pajés, transcrevendo e traduzindo o repertório. Eles não têm perdas lingüísticas. Impressiona a capacidade da transmissão de conhecimento entre eles”, destaca. Autora de livros e à frente de iniciativas pró-Maxakali, Rosângela atualmente integra a Universidade Federal do Sul da Bahia, em Porto Seguro.
Filme
A pré-estreia do filme Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá ocorrerá no jardim do Palácio do Catete, às 18h30. Às 20h, será o debate com a presença da ministra dos Povos Indígenas Sônia Guajajara, os diretores Sueli Maxakali, Isael Maxakali e Roberto Romero, e do professor Eduardo Viveiros de Castro. No dia 10 de julho, entra em circuito em salas de cinema de todo o país. O documentário registra a busca de Sueli e Maiza Maxakali pelo pai, Luis Kaiowá, que foi separado delas durante a ditadura militar no Brasil. Roberto Romero codirige o filme que parte da separação de Luís Kaiowá da mulher e das filhas no contexto da ditadura militar. A busca de Sueli e Maiza para reencontrar o pai começa a se configurar a partir das redes sociais, atravessa a pandemia de Covid-19 e oferece uma visão sobre momentos que transpassam as realidades do país em vários tempos. Como as lutas enfrentadas pelos povos indígenas no Brasil contemporâneo. No site www.meupaikaiowá.com.br há mais informações sobre o filme.
Serviço:
Hãmxop tut xop – as mães das nossas coisas: artesanato em fibra de embaúba. Abertura às 17h na Sala do Artista Popular. No jardim do Palácio do Catete, às 18h30, ocorre a pré-estreia do documentário “Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá”. Às 20h, começa o debate reunindo a Ministra dos Povos Indígenas Sônia Guajajara, os diretores Roberto Romero, antropólogo também autor da pesquisa e texto da exposição, Sueli Maxakali, Isael Maxakali e do professor Eduardo Viveiros de Castro. Entrada franca.
Museu de Folclore Edison Carneiro – Rua do Catete, 179. Catete – RJ. Tel. 21 3032.6052 | Inauguração: 03 de julho, às 17h. Encerramento: 28 de setembro
Dias e horários de visitação: Terça a sexta-feira, das 10h às 18h. Sábados, domingos e feriados, das 11h às 17h.
Realização:
Associação Cultural de Amigos do Museu do Folclore Edison Carneiro (Acamufec), Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular do Instituto de Patrimônio e Histórico e Artístico Nacional (CNFCP-Iphan)
Apoio:
Museu da República