Réus e testemunha se reuniram no STF para explicar divergências e versões distintas sobre a tentativa de golpe.
Por Redação, com Brasil 247 – de Brasília
A ação penal que investiga a tentativa de golpe de Estado no final do governo de Jair Bolsonaro (PL) avançou para uma nova e delicada fase nesta terça-feira, com a realização de duas acareações envolvendo personagens centrais da trama. Segundo o diário conservador carioca O Globo, o Supremo Tribunal Federal (STF) foi palco dos confrontos entre os ex-ministros Walter Braga Netto e Anderson Torres com, respectivamente, o tenente-coronel Mauro Cid e o ex-comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes.

As sessões foram solicitadas pelas defesas de Braga Netto e Torres e foram conduzidas pelo relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, com a presença do procurador-geral da República, Paulo Gonet. O Código de Processo Penal prevê o procedimento sempre que houver divergências sobre “fatos ou circunstâncias relevantes” entre versões de investigados e testemunhas.
O general Braga Netto chamou de “mentiroso” o tenente-coronel Mauro Cid, que ficou calado diante da acusação, feita durante acareação realizada na ação penal que apura um golpe de Estado fracassado que teria sido liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
O relato foi feito pelo advogado José Luis Oliveira Lima, que defende Braga Netto. Após a acareação, Juca, como é conhecido, disse a jornalistas que “o general Braga Netto, em duas oportunidades, afirmou que o senhor Mauro Cid, que permaneceu por todo ato com a cabeça baixa, era mentiroso. E ele [Cid] não retrucou quando teve oportunidade”.
Disputa entre versões
A primeira acareação, marcada, colocou frente a frente Braga Netto e Mauro Cid. O tenente-coronel citou o general da reserva em sua delação premiada, mencionando supostas tratativas para o financiamento de ações golpistas. A defesa do ex-ministro contesta dois pontos centrais: uma reunião ocorrida na casa de Braga Netto, em novembro de 2022, e a alegada entrega de dinheiro por parte dele a Cid.
Cid afirmou às autoridades que participou de uma reunião na residência de Braga Netto com outros dois militares, onde os presentes teriam manifestado insatisfação com o resultado das eleições e com a atuação das Forças Armadas. Disse ainda que precisou sair antes do fim do encontro. Já Braga Netto classificou a ocasião como uma “visita de cortesia” e sustentou que Cid permaneceu até o encerramento.
Outro trecho polêmico do depoimento de Cid se refere à entrega de recursos para a execução de um plano golpista. O militar relatou que, após não conseguir o valor com o PL, procurou Braga Netto, que teria lhe entregue o dinheiro no Palácio da Alvorada — ora em uma sacola de vinho, ora em uma caixa do mesmo produto, segundo versões distintas. Braga Netto nega veementemente qualquer participação na entrega de valores.
Torres e as reuniões no Alvorada
Às 11h foi a vez do ex-ministro da Justiça Anderson Torres ser confrontado com o general Freire Gomes, ex-comandante do Exército. O foco foi esclarecer a presença de Torres em reuniões realizadas no Palácio da Alvorada, onde, conforme relatos, Jair Bolsonaro teria apresentado propostas para contestar o resultado da eleição de 2022.
Freire Gomes, ouvido como testemunha de acusação, afirmou que Torres esteve em pelo menos uma dessas reuniões, destinadas à discussão de medidas de exceção. “O papel dele foi no sentido de explicar juridicamente algum ponto ali”, disse o general. Torres nega ter participado dos encontros e cita registros oficiais que indicam que ele e o general não estiveram no local no mesmo momento.
Outro ponto sensível é o documento encontrado na casa de Torres, que previa a decretação de um estado de defesa. Em um primeiro momento, Freire Gomes disse à Polícia Federal que o conteúdo do documento foi debatido nas reuniões; posteriormente, em depoimento ao STF, ajustou a declaração e afirmou que o teor era apenas “semelhante”.
Presenças, logística e condução
As acareações ocorreram em uma das salas de audiência do STF, em anexo à sede da Corte, com acesso restrito. Braga Netto, que está preso preventivamente em uma unidade militar no Rio de Janeiro desde dezembro de 2024, foi autorizado a se deslocar a Brasília para comparecer presencialmente — sendo esta sua primeira saída desde o início da detenção. Em seus depoimentos anteriores, ele havia participado por videoconferência.
Já Freire Gomes, que reside em Fortaleza, solicitou participar de forma remota, mas acabou abrindo mão do pedido. Jair Bolsonaro, também réu na ação, tem direito a acompanhar a sessão, mas sua presença ainda é incerta devido ao tratamento de uma pneumonia.
Confrontos decisivos para o processo
As acareações desta terça-feira podem ter papel decisivo na condução dos processos contra os envolvidos na tentativa de golpe. O objetivo das defesas é descredibilizar os relatos que embasam parte significativa da acusação do Ministério Público, enquanto Moraes e a PGR buscarão esclarecer os elementos contraditórios que persistem após os depoimentos já realizados.
Ao final das sessões, o STF deverá avaliar se os novos elementos confirmam ou desmontam as versões já apresentadas em juízo e, a partir disso, determinar os próximos passos do processo judicial.