De acordo com o relatório, o processo de favelização ao longo das linhas da SuperVia transformou os trilhos em corredores de moradia precária.
Por Redação, com Agenda do Poder – do Rio de Janeiro
Um levantamento conduzido pela equipe do vereador Pedro Duarte (Novo) traçou um diagnóstico alarmante das condições de segurança, infraestrutura e controle nas estações de trem do Rio de Janeiro. Intitulado “Caos nos Trilhos: um retrato dos caminhos esquecidos”, o estudo foi realizado entre março e maio de 2025 e vistoriou 38 das 104 estações da SuperVia.

A reportagem é baseada nas informações apuradas pelo portal G1 e no relatório do parlamentar, que preside a Comissão de Assuntos Urbanos da Câmara Municipal do Rio. Segundo o documento, a favelização no entorno dos trilhos, a presença do tráfico de drogas, o colapso da fiscalização e a evasão tarifária são fenômenos recorrentes em diversos ramais da malha ferroviária fluminense.
– É enorme o impacto na vida dos cariocas e de moradores de outras cidades que se locomovem todos os dias para o Rio, e, diante da inércia do Poder Público estadual, a comissão continuará fiscalizando e pautando a opinião pública – afirmou Pedro Duarte.
O parlamentar pretende encaminhar o relatório ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, à Agetransp e à Secretaria Estadual de Transportes, cobrando providências.
Favelização dos trilhos e insegurança
De acordo com o relatório, o processo de favelização ao longo das linhas da SuperVia transformou os trilhos em corredores de moradia precária e descaracterizou sua função como via de transporte seguro. Em pontos como o trecho entre Jacarezinho e Del Castilho, no ramal Belford Roxo, barracos de madeira avançam sobre os trilhos, com lixo acumulado e usuários de drogas em circulação constante.
Esse cenário compromete a operação dos trens, que são obrigados a reduzir a velocidade, gerando atrasos frequentes e aumentando o risco de acidentes. A crise habitacional e a ausência de ordenamento urbano nos arredores da linha férrea são apontadas como causas estruturais do problema.
Estações em situação crítica
Entre as estações mais críticas apontadas pelo estudo, destacam-se:
Jacarezinho: A equipe encontrou centenas de barracos improvisados e uso aberto dos trilhos como via de passagem, com consumo e venda de drogas à vista e ausência efetiva de fiscalização.
Parada de Lucas: A estação tem muros violados com acesso clandestino, comércio informal associado a ponto de venda de drogas e infraestrutura em colapso.
Mocidade-Padre Miguel: Passageiros entram por passagens irregulares, há boca de fumo ao lado dos trilhos e usuários de drogas espalhados pelo local. A equipe de vistoria chegou a receber uma oferta de produto furtado.
Senador Camará: O local apresenta abandono total, com tráfico na plataforma, comércio informal dentro da estação e nenhuma estrutura de abrigo para passageiros.
Campo Grande, embora com organização superior, também sofre com favelização nos fundos da estação, o que expõe o contraste entre operação regular e urbanização precária.
Evasão tarifária generalizada
O levantamento identificou 16 estações com falhas graves no controle de acesso. Segundo os dados utilizados na apuração, 54 mil pessoas estariam utilizando os trens diariamente sem pagar passagem, gerando prejuízo superior a R$ 8,4 milhões por mês. A SuperVia, no entanto, contestou os números e afirma que, atualmente, 18 mil passageiros por dia viajam sem pagar.
– É impossível manter controle e fiscalização em estações onde o Poder Público simplesmente não está – disse o vereador.
A prática da evasão, além dos prejuízos econômicos, representa risco à vida dos passageiros, com registro de acidentes e até mortes.
– O impacto para o usuário é direto. São trens inseguros, estações precárias, deslocamentos cada vez mais difíceis. A concessão ferroviária foi tratada como um tema isolado, quando, na verdade, depende de um conjunto de políticas públicas, segurança, mobilidade urbana, habitação, ordenamento do território – completou Duarte.
A estação Mercadão de Madureira, na Zona Norte, foi citada como caso extremo de evasão institucionalizada, tolerada inclusive por seguranças.
Como e onde ocorrem os acessos irregulares
As vistorias revelaram práticas sistemáticas de entrada clandestina nos trens. Em estações como Parada de Lucas, Duque de Caxias, Paciência, Costa Barros, Pavuna e Queimados, os acessos irregulares são facilitados por muros baixos, passagens abertas, ausência de agentes ou mesmo conivência com a prática.
O Ramal Deodoro foi o único em que a equipe não identificou evasão, com destaque para estações como Praça da Bandeira e Quintino, onde os seguranças atuam de forma eficaz.
Contexto da concessão
A SuperVia assumiu a operação dos trens urbanos em 1998. Em crise financeira, a concessionária entrou em recuperação judicial em 2021. Em 2024, o BNDES iniciou a cobrança judicial de uma dívida de R$ 1,3 bilhão.
Diante do risco de paralisação do serviço, um acordo emergencial entre o Governo do Estado e a SuperVia injetou R$ 300 milhões na operação e definiu um prazo de 270 dias para transição e novo modelo de concessão. A malha ferroviária tem 270 quilômetros e transporta cerca de 300 mil pessoas por dia útil.
O que dizem os citados
A SuperVia reconheceu o problema da evasão e informou que o número de passageiros não pagantes vem caindo nos últimos anos, de 54 mil por dia em 2023 para 18 mil em 2025. A empresa destacou a atuação de agentes de segurança e do Proeis, além de ações com moradores e autoridades para reduzir a prática.
“A evasão e outras condutas irregulares refletem o grave desafio da segurança pública no estado. A SuperVia segue colaborando com as autoridades competentes para garantir um ambiente mais seguro para seus passageiros”, afirmou a concessionária.
O Governo do Estado, por meio da Secretaria de Transportes, também reconheceu o impacto da evasão na sustentabilidade do sistema e disse estudar medidas como redução tarifária, reformas de muros e reforço na segurança.
Já a Polícia Militar, por meio da Secretaria de Estado de Polícia Militar, afirmou que atua com o Grupamento de Policiamento Ferroviário (GPFer) nas estações e com unidades operacionais em 270 km de trilhos para coibir ações criminosas. O órgão reforçou a importância da denúncia por meio dos canais 190 e aplicativo 190 RJ.