Os absurdos históricos do samba-enredo zombeteiro do Lalau são menos absurdos do que o apoio da esquerda brasileira desvirtuada a uma miniatura de Hitler e Stalin
Uma avaliação política brasileira torna-se complicada se fizermos algumas comparações com o quadro internacional da invasão da Ucrânia pela Rússia de Vladimir Putin.
Embora a ONU, a União Europeia, a Comissão de Direitos Humanos e outras tantas organizações tenham condenado a invasão da Ucrânia, tanto a posição do governo Bolsonaro como da esquerda brasileira são ambíguas.
Por Rui Martins
Depois de ter ido a Moscou, onde Bolsonaro reafirmou sua confiança em Putin (poucos dias antes da invasão da Ucrânia), o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, garantiu o apoio para o ingresso do Brasil como membro permanente no Conselho de Segurança da ONU.
O presidente Jair Bolsonaro agradeceu a Putin seu apoio à soberania nacional na questão da Amazônia, "quando alguns países questionaram a Amazônia como patrimônio da humanidade".
Em retribuição, o Brasil, em Genebra, se declarou neutro na questão da invasão da Ucrânia pela Rússia.
A maioria da mídia brasileira e figuras conhecidas do PT, apesar das más companhias no Brasil, não escondem seu apoio ao também homofóbico Putin, no que continuam a chamar de operação militar especial.
Ignoram ou fazem de conta que a Rússia não é um exemplo para a esquerda internacional. E, muito menos, Putin um líder de esquerda, já que compartilha do conservadorismo hipócrita de Bolsonaro e conta também com a benção de religiosos (caso do patriarca da Igreja Ortodoxa Russa).
Seguem algumas mostras bem evidentes dessas contradições envolvendo atualidades internacionais e a mídia de esquerda brasileira:
— Marine Le Pen, que disputará o 2º turno nas eleições presidenciais francesas, líder do partido de extrema-direita União Nacional, não escondia sua proximidade com o presidente russo Vladimir Putin. Um adversário seu nas eleições francesas, Eric Zemmour, também de extrema-direita, se queimou por ter demorado a assumir uma posição contra Putin. logo depois da invasão da Ucrânia;
— o Brasil 247, considerado de esquerda, é pela operação militar especial desfechada pela Rússia contra a Ucrânia e coloca em dúvida todas as atrocidades atribuídas aos soldados russos (sua fonte de informação é geralmente a agência de informação Sputnik);
— a agência Sputnik e o informativo Russian Today são considerados informativos estatais russos pela União Europeia e foram proibidos nos países a ela pertencentes. Essa dúvida quanto à independência dessas duas agências noticiosas não é de hoje. Emmanuel Macron sentiu-se visado pela Sputnik na primeira campanha presidencial e a considera um órgão de influência. Num relato feito pelo jornal Libération, Sputnik e Russian Today foram citadas por como difusoras de falsas informações nas eleições de 2017, favorecendo Marine Le Pen, depois de terem também agido em favor de Trump nos EUA.
— no Brasil, os evangélicos, com seus líderes Silas Malafaia, Edir Macedo, Marco Feliciano e Cláudio Duarte, entre outros, apoiam a política de extrema-direita aplicada por Bolsonaro, assim como os religiosos ortodoxos russos apoiam nas suas orações o presidente Putin.
— o jornalista Milton Blay foi demitido do Brasil 247 por ter criticado afirmações antissemitas do editor de “O Mundo como ele é”, José Reinaldo de Carvalho, e, por tabela, condenar a invasão da Ucrânia por Putin. (por Rui Martins, de Genebra, publicado originalmente no Observatório da Imprensa e com iconografia do blog Náufrago da Utopia)
Os absurdos históricos do samba-enredo zombeteiro do Lalau
são menos absurdos do que o apoio de parte da esquerda brasileira
desvirtuada a uma miniatura de Hitler e Stalin
Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu “Dinheiro Sujo da Corrupção”, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, “A Rebelião Romântica da Jovem Guarda”, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.
Direto da Redação é um fórum de debates publicado no Correio do Brasil pelo jornalista Rui Martins.