São raras as mostras coletivas sobre modernismo brasileiro em que não estejam presentes as telas de Tarsila do Amaral. Individuais, entretanto, contam-se nos dedos.
A última realizada foi de dezembro de 2005 a fevereiro de 2006, em Paris, encerrando as comemorações do Ano do Brasil na França, e dela pouco se falou no Brasil. A exposição, prevista anteriormente para ser no Museu do artista Lèger, em Biot, amigo e mestre dos anos 20, foi realizada na Maison de L´Amerique Latine, no Boulevard Saint German, em Paris, e teve como curadores a diretora do Museu Nacional Fernand Lèger, Brigitte Hedel-Samson e Paulo Herkenhoff, na época à frente do Museu de Nacional de Belas Artes.
Foi a primeira exposição individual da obra da artista em Paris desde 1928, oportunidade em que foi apresentada ao mundo a emblemática tela O Abapuru, há setenta e oito longos anos. Em salas ao lado, a exposição da Maison de L`Amerique apresentou obras de artistas franceses que conviveram com Tarsila como Fernand Lèger, Albert Gleizes, Gorges Valmier.
A mostra reuniu 15 pinturas da artista e 25 desenhos, em sua maioria, produzidos no período em que ela esteve em Paris, de 1923 a 1929, e das fases Pau Brasil e Antropofagia. Foram exibidas as telas Auto-retrato, de 1923, mais conhecida dos franceses de Manteau Rouge, do Museu Nacional de Belas Artes; Auto-retrato e Retrato de Mário de Andrade, ambos produzidos em 1922 em pastel, pertencentes ao IEB/USP; Carnavalem Madureira, de 1924 da Fundação José e Paulina Nemirovsky; O Mamoeiro, de 1925, do IEB/(USP); Os Anjos, 1924, da coleção Gilberto Chateaubriand; Palmeiras, de 1925, coleção particular; Religião Brasileira, de 1927, do acerco do Palácio do Governo de São Paulo; Pont Neuf, de 1923, da coleção Geneviève e Jean Boghici/RJ; São Paulo, de 1924, da Pinacoteca do Estado de São Paulo; O Vendedor de frutas, de 1925, e Urutu, de 1928, ambos da coleção Gilberto Chateaubriand , expostas no MAM/RJ; Sol Poente, de 1929, e O Sono, s.d., ambas da coleção Geneviève e Jean Boghici, Rio de Janeiro.
Não poderia deixar de estar presente A Negra, de 1923, obra mais importante de seu período parisiense, pertencente ao MAC/SP e os estudos dessa obra, produzidos na mesma época pela artista: um em nanquim e outro à lápis e aquarela, o primeiro do MAM/RJ e o segundo do IEB/SP. Além desses trabalhos, foram exibidos desenhos, estudos, recortes de jornais da época, exemplar da revista Antropofagia, e cartas dos artistas franceses para o casal Tarsila e Oswald.
Leia a seguir, trechos dos textos dos curadores Paulo Herkenhoff e Brigitte Hedel-Samson publicados no catálogo Tarsila do Amaral, Peintre Brésilienne a Paris 1923-1929, de 2005, ainda não editado no Brasil.
As duas e a única Tarsila - por Paulo Herkenhoff
Bilhete para a modernidade
Em 1920 e 1922, Tarsila estudou em Paris na Academie Julien, com Émile Bernard. Nesse período, ela faz uma dúzia de nus acadêmicos. Tarsila não participou da Semana de Arte Moderna de 1922, a radical iniciativa do pintor carioca Di Cavalcanti. Depois do impacto do evento no país, Tarsila, finalmente, quis ser moderna. Em São Paulo, fora aluna do mencionado pintor acadêmico Pedro Alexandrino. No final de 1922, compra seu duplo bilhete para a modernidade: passa a namorar o poeta Oswald de Andrade e volta à Paris. Mais tarde, Mario de Andrade batizou o casal de "Tarsiwaldo".
Por seu forte impacto, a viagem de Tarsila e Oswald a Paris é a segunda Missão Artística Francesa na história brasileira - cem anos depois da primeira - , que modernizou o sistema de arte no Brasil frente ao sistema de arte colonial dominado pela arte religiosa barroco-rococó em pleno século XIX. (...) Ao contrário de 1916, a Missão Francesa de 1923 se operou com a ida de brasileiros à França, em busca de novos parâmetros para a arte e uma ousada inserção, de resto não tão bem sucedida, no mercado francês. Ainda estudante, Tarsila já queria