Ao negar recurso apresentado pela Petrobras, relativo à cobrança de IPTU em área arrendada no Porto de Santos, o STF reconheceu a constitucionalidade da cobrança.
Por Redação, com Reuters - de Brasília e Santos (SP)
Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) do início do mês que autoriza prefeituras a cobrarem IPTU de empresas privadas que ocupam imóvel público vem preocupando o governo federal e empresas que possuem concessões na área de infraestrutura, tanto pela tributação adicional que pode causar em áreas como terminais portuários e rodovias, como pelo impacto no interesse de investidores em futuras concessões.
Ao negar recurso apresentado pela Petrobras, relativo à cobrança de IPTU em área arrendada no Porto de Santos, o STF reconheceu a constitucionalidade da cobrança, “com repercussão geral”, o que, para especialistas, pode estender a cobrança a outros tipos de concessões.
— Quando o Supremo coloca ‘repercussão geral’ ele não atinge só o setor portuário, mas todo o setor de infraestrutura sob concessão — disse o diretor presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), José Di Bella Filho.
Prefeitura
A Associação tem entre seus membros empresas como Braskem, Cargill, Copersucar, Rumo e Ultrapar. Somente no caso de Santos, a estimativa da prefeitura é de que a cobrança arrecade cerca de R$ 13 milhões por ano; além disso, a cobrança do retroativo desde 2000, quando foi iniciada a ação judicial, chega a cerca de R$ 300 milhões.
— Foi uma ação que o Supremo estabeleceu de repercussão geral, a decisão vai ter repercussão para o Brasil inteiro. Todas as cidades portuárias, as cidades que têm área concedida para qualquer atividade poderão cobrar o IPTU das empresas — disse à agência inglesa de notícias Reuters o prefeito de Santos, Paulo Barbosa (PSDB).
Segundo Di Bella, o setor portuário analisa agora os próximos passos. Uma das possibilidades seria pedir o reequilíbrio dos contratos junto ao governo, o que pode levar, por exemplo à redução do montante pago à União a título de outorga das áreas arrendadas.
Cobrança
— Ou eu faço um repasse da União para o município; ou vou ter de mexer no preço. As margens são muito pequenas — disse.
Em nota, a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR) ressalta que a decisão do STF representa uma mudança no posicionamento histórico do tribunal sobre o assunto.
O presidente da instituição, o ex-ministro dos Transportes César Borges, disse que o setor vai tentar se colocar como parte interessada no caso para buscar esclarecimentos sobre qual é a real extensão da cobrança, e se atinge mesmo outros setores.
Voracidade
— Espero que o STF possa esclarecer; mas tenho confiança de que o tribunal vai manter o entendimento que sempre teve — disse Borges.
Ele observa que, se confirmada, uma eventual cobrança de IPTU em rodovias teria impacto nas tarifas dos pedágios.
— A despeito de não haver menção expressa à incidência do IPTU às concessionárias de serviços públicos, diversas concessionárias de rodovias têm relatado um movimento bem mais intenso de diversos municípios em relação à cobrança do IPTU sobre bens públicos por ela operados no regime de concessão (tais como praças de pedágio, passarelas, trechos rodoviários, etc) — diz a ABCR, que representa empresas como CCR e Ecorodovias.
O presidente-executivo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Venilton Tadini, avalia que “dadas as condições financeiras deterioradas dos governos, esse caminho tende a ser explorado com muita voracidade pelos gestores públicos”.
— Haverá desdobramentos que podemos imaginar: encarecimento de custos para o usuário final, pois o concessionário ou arrendatário terá direito a obter o reequilíbrio na forma que estiver estipulado em lei ou em contrato — acrescentou Tadini.
Efeito prático
Uma fonte do governo que trabalha com concessões disse que a decisão do STF é preocupante.
— A decisão tem dois efeitos. Um deles, mais abrangente, é o impacto no princípio da segurança jurídica. Quando entraram no negócio, os investidores das concessões não tinham essa condição. Isso pode afugentar investidores — disse
O segundo ponto, de acordo com essa fonte, é o efeito prático no dia a dia dos atuais contratos. Ele ressalta que, somente na área de portos, há hoje cerca de 200 contratos de arrendamento.
— Imagine se o governo tiver de avaliar pedidos de reequilíbrio em todos eles? — questiona.
Além disso, a fonte também avalia, assim como os representantes do setor privado; que há o risco da cobrança se estender para outros setores.
— É bem possível que isso aconteça. Se acontecer, teremos de fazer ajustes nos estudos de futuras concessões — disse.
Decreto dos Portos
Além da questão do IPTU, outra preocupação do setor portuário é a situação do chamado Decreto dos Portos. O documento foi assinado pelo presidente Michel Temer no ano passado. No entanto, a prática não está gerando efeitos; à medida que o governo aguarda posição final do Tribunal de Contas da União (TCU) para assinar contratos.
O decreto, amplia prazos para contratos de concessão e arrendamentos e flexibiliza regras para estimular investimentos; avaliados na época em até R$ 25 bilhões. A medida, porém, acabou se tornando alvo de investigações que envolvem o presidente de facto, Michel Temer; em suposto favorecimento da empresa Rodrimar. O governo nega as acusações.
Para Di Bella, da ABTP, a assinatura de contratos com base nos decretos é fundamental para destravar investimentos necessários. E para o setor acompanhar o crescimento da demanda.
— Se o decreto não exercer seus efeitos, se os contratos não forem assinados, acontecerá o caos. A infraestrutura não será capaz de atender à demanda — concluiu.