Bolsonaro vai completar no final de março o 27º mês de um total de 48 previstos para a cumprimento de seu mandato presidencial. As pesquisas de opinião evidenciam um processo crescente de derretimento da popularidade em vários setores da sociedade brasileira.
Por Paulo Kliass – de Brasília
Bolsonaro vai completar no final de março o 27º mês de um total de 48 previstos para a cumprimento de seu mandato presidencial. As pesquisas de opinião evidenciam um processo crescente de derretimento da popularidade em vários setores da sociedade brasileira. O ex-capitão tenta se equilibrar entre dois campos aparentemente inconciliáveis. De um lado, ele mantém o discurso autenticamente extremado para sua base forjada no direitismo negacionista, autoritário e intolerante. De outro lado, ensaia alguns recuos para se mostrar mais palatável e menos indigesto a quem ainda se dispõe a apoiá-lo em troca de algumas benesses de poder.Moro e Guedes: usados até o fim
Porém, Bolsonaro foi conferindo ao seu governo a sua verdadeira marca. Aos poucos foi recheando a equipe de generais e oficiais de alta patente, aos mesmo tempo em que estabelecia os limites da autonomia inicialmente prometida para os 2 superministros. Moro rompeu a corda bem antes do previsto e saiu do governo em abril de 2020. Guedes segue à frente de sua pasta, mas boa parte de sua equipe inicial de auxiliares de segundo escalão já pediu demissão. Bolsonaro rompeu com sua promessa de uma “nova forma de fazer política” e se aliou ao fisiologismo do Centrão, apoiando candidatos do grupo para as presidências da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. A chegada da pandemia há um ano atrás mudou completamente o enredo incialmente previsto por ele. Manteve-se arraigado às loucuras de Trump e menosprezou as gravidade da pandemia. Trouxe o negacionismo de seu governo terraplanista também para o campo da epidemiologia. Conhecemos bem a trajetória do “é só uma gripezinha”, “é uma bobagem essa obrigatoriedade da máscara”, “hidroxicloroquina é um ótimo tratamento precoce”, “e daí?”, “não sou coveiro”, “me chamo Messias, mas não faço milagres”, “vamos deixar de mimimi” e todas as demais aberrações proferidas por ele contra protocolos das entidades de saúde pública e da própria OMS. O presidente trocou por 3 vezes o titular da pasta da saúde, depois de colocar um general que nada conhecia da área por longos 10 meses. Não por acaso Bolsonaro está sendo processado em tribunais internacionais e reage com perseguição policial e jurídica a todos que busquem associar ao seu nome o adjetivo genocida.Pandemia e agravamento da crise
Os péssimos resultados provocados pela ausência de estratégia na luta contra o covid-19 colocaram o Brasil na condição dos sonhos do chanceler Araújo: pária internacional. Recentemente, o país alcançou a condição de primeiro lugar em número de mortes por dia, superando os Estados Unidos. Os resultados da política de arrocho fiscal e corte de verbas para as áreas sociais colocaram o Sistema Único de Saúde (SUS) às mínguas. O colapso das condições de atendimento nos postos de saúde e nos hospitais fez chegar às elites a falta de condições de tratamento e os óbitos não mais se localizam apenas nas camadas de base da nossa pirâmide da desigualdade. Ao longo dos próximos dias, devemos alcançar a triste marca de 300 mil mortes. As vacinas tardam a chegar por conta da falta de vontade do governo desde o início e agora somos apenas mais uma nação a disputar as doses no cenário internacional com todos os demais países. Esse agravamento do quadro tem se refletido nas pesquisas de opinião e Bolsonaro começa a colecionar níveis recordes de desaprovação de seu governo. A incapacidade de sua equipe em apresentar respostas para a vida difícil da maioria da população desempregada, desalentada e precarizada começa a apresentar a sua fatura política. É importante lembrar que essa parcela importante de nosso povo passou o primeiro trimestre sem nenhum tipo de auxílio para enfrentar as dificuldades da crise. Afinal, Guedes havia convencido o chefe de que a pandemia acabaria em 31 de dezembro passado e que, portanto, a renovação do benefício não se fazia necessária. Pois agora, foi feito todo um carnaval para aprovar quatro parcelas de míseros R$ 150 para um número menor de famílias do que os R$ 600 que a oposição havia conseguido aprovar em abril de 2020.Isolamento político a todo vapor
A continuidade da recessão e a falta de perspectivas para sua superação parecem ter subido ao andar de cima. Finalmente, parece ter caído a ficha para esse pessoal que a continuidade da política econômica de Guedes não cria demanda capaz de apontar alguma luz no final do túnel. Além disso, as elites empresariais começam a sentir a chegada da doença em seus redutos, ainda que os condomínios sejam cercados por muros elevados e fortes esquemas de segurança reforçada. Seus planos de saúde, antes aceitos pelos hospitais mais caros do país, não mais servem para abrir leitos nas UTIs lotadas. O colapso do sistema de saúde afeta a todos. O gráfico abaixo é um belo exemplo da tendência de reprovação do governo também nesse meio empresarial. Ao longo de dois anos, a rejeição mais do que triplicou.
Paulo Kliass é doutor em economia e membro da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal.
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