É como o Brasil presenciasse diariamente um desastre aéreo, sem sobreviventes, de avião com 150 passageiros, nos últimos 50 dias, comparou o especialista. Ou, ainda, quase o dobro do número de mortes de civis estimadas pela ONU, até o fim de junho, durante a guerra na Ucrânia.
Por Redação, com RBA - de Brasília
Em 22 de maio, o ministério da Saúde anunciava o fim o estado de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin), provocado pela pandemia da covid-19 no país. Na ocasião, o Governo Federal justificou a decisão em função do avanço da vacinação e de um cenário epidemiológico “mais arrefecido”. O momento marcava o fim da onda ômicron. No entanto, de lá para cá, o país registrou 8.230 mortes pela doença. A média móvel de vítimas calculada em sete dias monitorado pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), que na segunda-feira ficou em 246, registrou alta estarrecedora de 143,5%, nesse período.
Extermínio: Desde o fim de maio, número de vítimas da covid-19 no Brasil é quase o dobro da guerra na Ucrânia
– Curiosamente, a Semana Epidemiológica (SE) 21 (22 a 28 de maio/22), marcou não apenas o fim da Espin, mas a reversão na queda de mortes por Covid-19 no Brasil – afirmou o epidemiologista da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Jesem Orellana.
É como o Brasil presenciasse diariamente um desastre aéreo, sem sobreviventes, de avião com 150 passageiros, nos últimos 50 dias, comparou o especialista. Ou, ainda, quase o dobro do número de mortes de civis estimadas pela ONU, até o fim de junho, durante a guerra na Ucrânia.
– Portanto, ao invés de salvar vidas, o Brasil segue exterminando seu próprio povo, sem qualquer pudor de negar, até hoje, o efeito protetor de medidas como uso de máscaras e do distanciamento físico para limitar a disseminação viral – declarou Orellana. Ele também frisou que, até hoje, vem sendo negado o direito à vacinação contra a covid-19 em crianças menores de 5 anos. E criticou “o atraso e a letargia” na vacinação das crianças de 5-11 anos, no início de 2022, o que resultou em centenas de mortes evitáveis“.
Disseminação
Após o fim da Espin, o Brasil passou a lidar com linhagens “descendentes” da ômicron, como a BA.2, a BA.4 e a BA.5. Ainda mais contagiosas, as subvariantes são capazes de burlar a proteção conferida pelos imunizantes, bem como superar a imunidade conferida por infeções anteriores.
Assim, a média móvel de casos saltou de 14.690, no final de maio, para 57.798 casos registrados atualmente. Trata-se de um aumento de 293,4% nesse índice, o que aponta para o recrudescimento da transmissão. No entanto, como ao longo de toda a pandemia, o governo Bolsonaro não tomou qualquer tipo de medida para conter o avanço da doença.
– Não podemos nos enganar com os quase 60 mil casos novos de covid-19 confirmados nas últimas duas semanas no Brasil. Pois esse número deve ser muito maior, devido ao pesado efeito da subnotificação na atual fase da epidemia no país – ressaltou o epidemiologista.
Nesse sentido, ele cobra a retomada de medidas preventivas, como uso de máscara em ambientes fechados, o distanciamento físico e a limitação de grandes eventos. Além disso, também alerta para a necessidade de ampliar a vacinação, especialmente das doses de reforço em vulneráveis.
Desesperança
Apesar dos alertas, Orellana não acredita numa mudança de postura com o atual governo. “Parece que seguiremos mergulhados no que pode ser o mais duradouro e letal exemplo de má gestão sanitária da história do Estado brasileiro”, lamentou.
– Certamente precisamos de mudanças, mas como elas não ocorreram ao longo de 28 meses de pandemia, só nos resta sonhar com dias melhores, a partir de 2023. Quem sabe, com governantes e formadores de opinião dispostos a salvar vidas e capazes de reconhecerem a importância e o necessário protagonismo do SUS e da ciência na vigência de crises sanitárias aterradoras como a pandemia de covid-19.